Grupo internacionalista de Venezuela e Argentina recebe sementes crioulas na Jornada de Agroecologia

O objetivo é compartilhar e reproduzir sementes para construir soberania alimentar na América Latina

Foto: Juliana Barbosa

Por Murilo Lemos Bernardon

As sementes crioulas de vários produtores agroecológicos do sul do Brasil vão germinar em solo argentino e venezuelano. Isso porque um grupo de 39 internacionalistas, 35 vindos de diversas comunas da Venezuela e quatro da organização Federação Rural na Argentina, receberam uma variedade de espécies de sementes crioulas produzidas pela Rede de Sementes Agroecológicas BioNatur e pelo Coletivo Triunfo na 20ª Jornada de Agroecologia. A entrega ocorreu durante a visita de João Pedro Stedile, da direção nacional do MST, à 20ª Jornada de Agroecologia.

No evento, ocorreu a partilha de 5 mil kits de sementes da BioNatur, além de mudas de árvores doadas pela Itaipu Binacional. A brigada internacionalista vai levar sementes de abóbora, amendoim, soja orgânica — todos são produtos agroecológicos, sem transgenia. Também houve compartilhamento de sementes de feijão preto, dentro de uma variedade de mais de 80 espécies diferentes na barraca das Sementes Crioulas, do Coletivo Triunfo, na Feira da Agrobiodiversidade. O feijão preto faz parte da base da alimentação venezuelana e é um dos ingredientes principais do Pabellón criollo, considerado o prato símbolo nacional da Venezuela. 

O casal Cesar Luis Kerber e Cida Kerber fazem um trabalho de resgate, produção, reprodução, manutenção e disseminação de sementes crioulas, livres de transgenia e de agrotóxico. Cesar afirma que esse compartilhamento “pode significar a soberania, porque o sistema capitalista chega e se apodera da cultura, da natureza, e por que não da biodiversidade de cada espaço que ele invade”.

Foto: Juliana Barbosa

“Para nós é gratificante poder fazer com que chegue nas mãos de pessoas necessitadas esses materiais genéticos que a gente cuida há tanto tempo, tantos anos”, conclui, que mora com a família no assentamento Contestado, na Lapa

Stedile acompanhou a seleção de sementes, no espaço do Coletivo Triunfo — a ideia é levar essa diversidade de sementes de feijão preto para a Venezuela para reproduzi-las e compartilhá-las com o povo, comunas, organizações dos movimentos sociais, do campo e da cidade.

Segundo ele, “um dos papéis da Jornada é esse, é promover o intercâmbio, a troca de ideias, experiências e deu essa casualidade que o Fhelipe está aqui com uma turma de quarenta jovens lá da Venezuela, quatro a companheiras também agricultoras da Argentina. Eles estão aqui convivendo aprendendo e nós estamos combinando aqui qual é a variedade que nós vamos pegar desse casal maravilhoso e levar para a Argentina e para a Venezuela, para que esse trabalho maravilhoso de reproduzir as sementes, de ser zeladores da sementes possa se multiplicar em outros países”.

Acompanhados por Fhelipe Emannuel, militante do MST de Alagoas, os internacionalistas fazem parte do Instituto de Educação Josué de Castro, do MST, em Viamão, no Rio Grande do Sul — uma escola de formação técnica em administração de cooperativas. Durante o curso, que dura seis meses ao todo, o grupo passou uma semana na BioNatur, uma rede de agricultores assentados pela Reforma Agrária, de produção de sementes com base agroecológica, e visitou outras cooperativas, de produção de arroz, de leite, por exemplo, em Minas Gerais, Santa Catarina e São Paulo.

Fiiorela Lazo, militante da Federação Rural na Argentina, explica que o espaço foi importante para adquirir muita aprendizagem. “Não só para nós mesmos, mas também para compartilharmos com nosso povo, já que nossa bandeira deve ser a agroecologia e devemos lutar contra a crise climática e contra o sistema capitalista”.

Outra militante da brigada internacional, Ana Luisa Sepulveda, vinda das comunas da Venezuela, afirma que o MST é um exemplo da América Latina em agroecologia: “ensinando aos povos irmãos, para que possamos nos apropriar e internalizar esse conceito, essa forma de vida, a ‘utopia dos povos’, o que sempre sonharam e o que ancestralmente praticavam os indígenas”, conta.

Foto: Juliana Barbosa 

A Venezuela vivia a partir da venda de petróleo e, com a impossibilidade do comércio devido ao bloqueio econômico que sofreu dos EUA e do sistema internacional de transações bancárias SWIFT, a renda de exportação deixou de existir. Como resposta, o país teve que se voltar para a produção de alimentos para abastecer a população e o mercado interno.

“Nos últimos quatro anos estive com a nossa brigada internacionalista Apolônio de Carvalho na Venezuela, que já tem dezoito anos contribuindo com o povo venezuelano, reproduzindo as sementes, principalmente sementes de hortaliças, que são mais rápidas de produção para alimentar o povo. E também a gente trabalha com a questão da da assistência técnica com os produtores mais voltados para a produção mesmo”, conta Fhelipe Emannuel.

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